Este artigo procura tratar objetivamente do funcionamento da regularização da representação processual em grau de recurso no âmbito do Processo do Trabalho.
O assunto tem importância destacada especialmente porque o art. 76, caput e § 2º, do CPC garante a regularização da representação processual em grau de recurso. O não conhecimento do recurso deve suceder apenas se for descumprida a determinação de sanação do vício. Veja-se:
Art. 76. Verificada a incapacidade processual ou a irregularidade da representação da parte, o juiz suspenderá o processo e designará prazo razoável para que seja sanado o vício.
§ 1º Descumprida a determinação, caso o processo esteja na instância originária:
I – o processo será extinto, se a providência couber ao autor;
II – o réu será considerado revel, se a providência lhe couber;
III – o terceiro será considerado revel ou excluído do processo, dependendo do polo em que se encontre.
§ 2º Descumprida a determinação em fase recursal perante tribunal de justiça, tribunal regional federal ou tribunal superior, o relator:
I – não conhecerá do recurso, se a providência couber ao recorrente;
II – determinará o desentranhamento das contrarrazões, se a providência couber ao recorrido.
Trata-se de regra que privilegia o princípio processual de primazia da decisão de mérito, uma das marcas primordiais do Código de Processo Civil de 2015, consagrado fundamentalmente nos arts. 4º e 7º.
Fazendo referência ao art. 76, § 2º, do CPC, o Tribunal Superior do Trabalho possui a Súmula nº 383, II, a qual proclama que se verificada a irregularidade de representação em fase recursal, em procuração ou substabelecimento já constante dos autos, deve ser designado prazo de cinco dias para sanar o vício, sob pena de não conhecimento do recurso ou das contrarrazões:
“II – Verificada a irregularidade de representação da parte em fase recursal, em procuração ou substabelecimento já constante dos autos, o relator ou o órgão competente para julgamento do recurso designará prazo de 5 (cinco) dias para que seja sanado o vício. Descumprida a determinação, o relator não conhecerá do recurso, se a providência couber ao recorrente, ou determinará o desentranhamento das contrarrazões, se a providência couber ao recorrido (art. 76, § 2º, do CPC de 2015)”.
Sucede que a despeito de o art. 76, § 2º, do CPC ter redação ampla, permitindo a regularização de qualquer vício de representação processual, o TST firmou seu entendimento de forma restritiva. Como se nota do enunciado jurisprudencial, a possibilidade de regularização restringe-se à hipótese de procuração ou substabelecimento constante dos autos e o instrumento estar eivado de vício. Nessa linha, não se admite sanar o vício se não houver procuração ou substabelecimento em nome do advogado subscritor do recurso.
O acórdão da SBDI-I, a seguir reproduzido, exemplifica essa compreensão, rejeitando a regularização porque o advogado que assinou o recurso não tinha procuração até o momento da interposição:
“AGRAVO. EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. IRREGULARIDADE DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL NA INTERPOSIÇÃO DOS EMBARGOS. AUSÊNCIA DE PROCURAÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 383, I, DO TST. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE PRAZO PARA SANEAMENTO. INADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE EMBARGOS MANTIDA POR FUNDAMENTO DIVERSO AO ADOTADO NA DECISÃO AGRAVADA. NÃO PROVIMENTO. I. Após constatar que o recurso de embargos havia sido assinado digitalmente por advogado que não possuía procuração juntada aos autos, tampouco detinha mandato tácito, o Presidente da Turma determinou a intimação do Banco reclamado, a fim de que regularizasse a representação processual, no que foi atendido. II. Todavia, conforme o item I da Súmula nº 383 do TST, é inadmissível o recurso firmado por advogado sem procuração juntada aos autos até o momento da sua interposição. III . Cumpre salientar que, na hipótese, não se trata de mera irregularidade de procuração ou substabelecimento já constante dos autos, não havendo que se falar , portanto, na concessão de prazo para saneamento do vício. Assim, inaplicável o item II da Súmula n° 383 do TST, porquanto esse verbete remete a situações em que já existe procuração ou substabelecimento do causídico nos autos e se constata na fase recursal que esse instrumento está eivado de vício, o que diverge do caso em análise. IV. Decisão de inadmissibilidade do recurso de embargos mantida por fundamento diverso ao adotado na decisão agravada. V. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento ” (Ag-E-ED-ARR-1127-31.2010.5.15.0017, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Evandro Pereira Valadão Lopes, DEJT 02/08/2024).
O acórdão a seguir identificado, admitindo a possibilidade de regularização, trata de caso em que a empresa recorrente teve sua denominação social alterada e o mandato foi conferido ao advogado sob a denominação social anterior à interposição do recurso:
“AGRAVO INTERNO EM EMBARGOS EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. ALTERAÇÃO DA DENOMINAÇÃO DA RAZÃO SOCIAL DA EMPRESA. AUSÊNCIA DE NOVA PROCURAÇÃO NOS AUTOS. IRREGULARIDADE DE REPRESENTAÇÃO. SÚMULA Nº 383, II, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de reconhecer que a parte de uma relação processual, quando tiver a razão social alterada, deve fazer a prova da alteração havida e apresentar procuração com a nova denominação, uma vez que a regularidade processual constitui pressuposto de admissibilidade recursal. Precedentes . Na hipótese, a subscritora do agravo interno, e também dos embargos, atua por intermédio de substabelecimento concedido por advogado cujo instrumento de mandato foi outorgado sob a denominação social anterior. Registre-se que, não obstante ter sido devidamente intimada para regularizar a representação processual, na forma dos artigos 3º, I, da Instrução Normativa nº 39/2016 do TST e 76, §§ 1º e 2º, do CPC, a executada deixou transcorrer in albis o prazo sem efetuar a referida regularização. Incidência da Súmula nº 383, II, do TST. Agravo interno não conhecido” (Ag-Emb-ED-RR-10010-61.2012.5.06.0141, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 18/10/2024).
Em casos assim, de já existir um mandato maculado de vício, a exemplo da alteração da incorreção do nome da parte, é admitida a sanação. Inexistente o mandato, não se concebe a sanação.
É importante que se observe essa distinção entre a literalidade do art. 76, § 2º, do CPC e a Súmula nº 383, II, do TST para que se evite problema relativo ao conhecimento do recurso por deficiência de representação.
Autor:
Beatriz Bellinaso
Advogada. Sócia do escritório Simpliciano Fernandes & Advogados. Atua principalmente em Tribunais Regionais do Trabalho e nos Tribunais Superiores. Inscrita na OAB/DF 73.851.