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Comprovação do prequestionamento no recurso de revista: evolução legislativa e jurisprudencial

Foi comentado em artigos anteriores veiculados em nosso site que se exige, para os recursos extraordinário, especial e de revista, o prequestionamento. Isso quer dizer que é essencial para o conhecimento do recurso que a matéria nele devolvida tenha sido tratada na decisão recorrida.

No tocante ao recurso de revista, há ainda outra exigência relativa ao prequestionamento: exige-se não apenas o prequestionamento, mas também sua comprovação. Trata-se de requisito de admissibilidade autônomo. Além de ser imprescindível que a matéria devolvida no recurso esteja prequestionada, é essencial, sob pena de não conhecimento, que a parte o comprove.

Esse pressuposto de admissibilidade é previsto pelo art. 896, § 1º-A, I, da CLT, que diz que, sob pena de não conhecimento, é ônus da parte “indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista”. Esse dispositivo foi incluído na CLT pela Lei nº 13.015/2014, que entrou em vigor em 20/09/2014.

O Tribunal Superior do Trabalho aplica esse dispositivo, exigindo a comprovação do prequestionamento, aos recursos de revista interpostos contra acórdãos publicados a partir da entrada em vigor de referida lei.

Sucede que a redação do art. 896, § 1º-A, I, da CLT não é clara e permite uma série de indagações sobre o que significa, exatamente, indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento.

De que maneira deve ser feita essa comprovação? É suficiente que o recorrente mencione, no recurso, em qual página do acórdão recorrido consta o prequestionamento da matéria?

Debruçando-se sobre isso, o Tribunal Superior do Trabalho definiu que a indicação do trecho significa transcrição do trecho. É imprescindível, portanto, que o recorrente, para comprovar o prequestionamento, promova a transcrição do trecho que revela que a matéria objeto do recurso foi objeto de pronunciamento pelo tribunal regional no acórdão recorrido. Não basta que o recorrente faça menção ou referência à página em que se situa o prequestionamento.

Como exemplo dessa jurisprudência, veja-se elucidativa ementa de acórdão proferido pela 4ª Turma do TST, sob relatoria do ministro João Oreste Dalazen, e publicado em curto período de vigência da Lei nº 13.015/2014:


“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. ADMISSIBILIDADE. LEI 13.015/2014. PREQUESTIONAMENTO. TRANSCRIÇÃO DO TRECHO DO ACÓRDÃO. ART. 896, § 1º-A, I, DA CLT 1. A Lei nº 13.015/2014 exacerbou os pressupostos intrínsecos de admissibilidade do recurso de revista, como se extrai do novel art. 896, § 1º-A, da CLT. 2. O novo pressuposto e ônus do recorrente consistente em “indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento” não se atende meramente por meio de menção ou referência à folha do acórdão em que se situa, tampouco mediante sinopse do acórdão, no particular. A exigência em apreço traduz-se em apontar a presença do prequestionamento (salvo vício nascido no próprio julgamento) e comprová-lo mediante transcrição textual do tópico nas razões recursais. Somente assim se atinge a patente finalidade da lei: propiciar ao relator do recurso de revista no TST maior presteza na preparação do voto ao ensejar que, desde logo, confronte o trecho transcrito com o aresto acaso apontado como divergente, ou com a súmula cuja contrariedade acaso é alegada, ou a violação sustentada de forma analítica pelo recorrente. 3. Inadmissível recurso de revista interposto sob a égide da Lei nº 13.015/2014 (decisões publicadas a partir de 22/9/2014) em que a parte não cuida de transcrever o trecho do acórdão regional em que repousa o prequestionamento da controvérsia transferida à cognição do TST. 4. Agravo de instrumento da Segunda Reclamada de que se conhece e a que se nega provimento”.

Definido que ao recorrente incumbe, mediante uma transcrição, indicar o trecho que consubstancia o prequestionamento, cabe uma outra indagação: o que, precisamente, deve ser transcrito para o cumprimento do pressuposto de admissibilidade? O recorrente deve transcrever um trecho específico da fundamentação que repute mais relevante ou deve reproduzir a integralidade do capítulo do acórdão em que se fundamentou sobre a matéria objeto do recurso?

A Subseção I de Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho uniformizou jurisprudência definindo que não se admite, para comprovação do prequestionamento, a transcrição integral do acórdão recorrido, do relatório, da ementa ou apenas do dispositivo. É essencial que se transcreva o trecho exato que consubstancia o prequestionamento. Confira-se:

“EMBARGOS REGIDOS PELA LEI Nº 13.015/2014 . RECURSO DE REVISTA NÃO CONHECIDO. REQUISITO DISPOSTO NO ARTIGO 896, § 1º-A, INCISO I, DA CLT. INDICAÇÃO DO TRECHO DA DECISÃO REGIONAL QUE CONSUBSTANCIA O PREQUESTIONAMENTO DA CONTROVÉRSIA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA. Nos termos da jurisprudência firmada nesta Subseção, acerca dos pressupostos intrínsecos do recurso de revista, insertos no artigo 896, § 1º-A, da CLT, é indispensável a transcrição do trecho exato da decisão recorrida que consubstancie o prequestionamento da matéria trazida ao debate, cabendo à parte a demonstração, clara e objetiva, dos fundamentos de fato e de direito constantes da decisão regional no tema debatido, não se admitindo, para tanto, a mera indicação das páginas correspondentes, paráfrase, sinopse, transcrição integral do acórdão recorrido, do relatório, da ementa ou apenas da parte dispositiva, pois, para fins de cumprimento da exigência legal, é imprescindível a transcrição textual do trecho da decisão recorrida. Portanto, a discussão sobre o cumprimento dos pressupostos intrínsecos do artigo 896, § 1º-A, da CLT está superada pela jurisprudência desta Subseção, o que impõe a incidência do artigo 894, § 2º, da CLT. Precedentes. Embargos não conhecidos”.

Esse trecho exato deve contemplar a integralidade da fundamentação do acórdão sobre a matéria, como decidido pela 7ª Turma do TST no Ag-AIRR-101859-64.2017.5.01.0049: “o apelo não atendeu a contento a exigência contida no artigo 896, § 1º-A, I, da CLT, já que não foi feita a transcrição de todos os fundamentos essenciais à compreensão dos motivos norteadores da decisão recorrida, em relação às matérias em destaque”.

Diante de todas essas sinuosidades que refletem as dificuldades práticas de cumprimento do requisito de admissibilidade em questão, é importante que a finalidade desse pressuposto seja bem compreendida pelo advogado que pretenda defender seu cliente por intermédio da interposição de recurso de revista. Assim, tenderá a ter mais facilidade para proporcionar o conhecimento do recurso de revista.

Deve-se ter em mente que a ideia do art. 896, § 1º-A, I, da CLT é permitir que os ministros do Tribunal Superior do Trabalho, lendo o recurso de revista, constatem que a matéria objeto de insurgência está prequestionada. Além disso, permitir que os ministros tenham conhecimento dos fundamentos (todos eles, naturalmente) que foram adotados pela Corte de Origem para solucionar o tema, os quais devem ser especificamente impugnados no recurso e que eventualmente deverão ser reanalisados pelo TST. Tudo isso sem que os ministros precisem, por sua própria conta, verificar diretamente o acórdão.

Daí porque a transcrição que não contempla todos os fundamentos é insuficiente: essa transcrição a menor não revela tudo o que o tribunal a quo compreendeu, que deve ser impugnado no recurso e que potencialmente deve ser reanalisado pelo TST. Tampouco suficiente é a transcrição de contempla apenas a ementa, o relatório ou o dispositivo do acórdão, uma vez que essas partes do acórdão não são a fundamentação, que é, esta sim, o que contempla o prequestionamento que deve ser comprovado.

Um outro aspecto de grande relevância dentro desse contexto é o da comprovação do prequestionamento no recurso de revista que suscita nulidade por negativa de prestação jurisdicional em virtude de ausência de fundamentação pelo tribunal regional. Trata-se de assunto que causou bastante controvérsia interpretativa e demandou uniformização jurisprudencial pela SBDI-I do TST.

O operador do Processo do Trabalho se indagava: tendo em vista que o debate é sobre ausência de motivação – e, portanto, de prequestionamento – relativamente a determinada matéria debatida no processo, deve-se comprovar o prequestionamento? Ou melhor, como comprovar o prequestionamento daquilo que não está prequestionado?

Essa interessante questão jurídica processual teve sua controvérsia interpretativa uniformizada pela SBDI-I do TST no E-RR-1522-62.2013.5.15.0067, de relatoria do ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, com a adoção do entendimento de que o recorrente, ao arguir nulidade por negativa de prestação jurisdicional, deve, sim, comprovar o prequestionamento. Isso deverá acontecer mediante a indicação (isto é, transcrição) dos trechos dos embargos de declaração em que se buscou o pronunciamento do tribunal e dos trechos que demonstram que o tribunal, apesar de instado mediante os embargos de declaração, se recusou a complementar a prestação jurisdicional.

É importante perceber que não se exige a comprovação do prequestionamento da matéria em relação à qual o tribunal de origem foi omisso, e sim da matéria da nulidade por negativa de prestação jurisdicional, que é o tema do recurso de revista. A ideia, nesse panorama, é demonstrar ao Tribunal Superior do Trabalho que se questionou, na instância a quo, o vício da decisão recorrida, bem como, mediante as transcrições, permitir que o TST constate a ocorrência da nulidade.

Esse entendimento jurisprudencial foi positivado pela Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), que incluiu o inciso IV no art. 896, § 1º-A, da CLT.

Posteriores decisões do Tribunal Superior do Trabalho externam a compreensão de que além dos trechos dos embargos de declaração e do respectivo acórdão é imprescindível reproduzir os trechos da fundamentação do acórdão principal (de recurso ordinário ou agravo de petição). Outras, porém, dizem que, relativamente ao tema da nulidade por negativa de prestação jurisdicional, é desnecessária a transcrição dos trechos do acórdão principal, uma vez que não há essa exigência no art. 896, § 1º-A, IV, da CLT. Diante dessa divergência interpretativa, é prudente, portanto, para evitar o não conhecimento do recurso, que o recorrente efetue a transcrição também dos trechos do acórdão principal.

Observados esses pontos, o recurso de revista tende a não ter seu conhecimento negado em razão do não atendimento ao requisito de comprovação do prequestionamento, previsto no art. 896, § 1º-A, I e IV, da CLT.

Autor:

João Marcelo Fernandes

Advogado. Sócio do escritório Simpliciano Fernandes & Advogados. Atua preponderantemente em tribunais, em especial nos Tribunais Regionais do Trabalho e nos Tribunais Superiores.

Bibliografia

  1. BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Disponível em: 1. <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 22 abril. 2024.
  2. Nesse sentido, o seguinte acórdão: TST, RR-159-79.2022.5.08.0209, 7ªT, j. 20/03/2024, rel. Min. Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 26/03/2024.
  3. TST, AIRR-10752-45.2014.5.03.0062, 4ªT, j. 02/12/2015, Rel. Min. João Oreste Dalazen, DEJT 18/12/2015.
  4. TST, E-ED-RR-242-79.2013.5.04.0611, SBDI-I, j. 17/05/2018, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, DEJT 25/05/2018.
  5. TST, Ag-AIRR-101859-64.2017.5.01.0049, 7ª Turma, j. 03/04/2024, Rel. Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 12/04/2024. No mesmo sentido, por exemplo: TST, Ag-AIRR-1001628-68.2017.5.02.0086, 1ª Turma, j. 10/04/2024, rel. Min. Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 12/04/2024; TST, Ag-AIRR-10681-26.2019.5.03.0108, 3ª Turma, j. 10/04/2024, rel. Min. Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 12/04/2024; TST, RRAg-3037-33.2013.5.02.0023, 6ª Turma, j. 03/04/2024, rel. Ministra Kátia Magalhães Arruda. DEJT 05/04/2024.
  6. TST, E-RR-1522-62.2013.5.15.0067, SBDI-I, j. 16/03/2017, rel. Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 20/10/2017.
  7. Nesse sentido, por todos: TST, Ag-RRAg-10637-76.2016.5.15.0011, 5ª Turma, j. 10/04/2024, rel. Min. Breno Medeiros, DEJT 12/04/2024.
  8. Nesse sentido, por todos: TST, ED-RR-10022-30.2017.5.15.0083, 7ª Turma, j. 03/04/2024, rel. Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 12/04/2024.

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